Corpo, Alma e Bits: Ressignificando a Experiência Contemporânea

Cada clique, cada interação deveria ser um ato de afirmação individual e não de submissão a lógicas pré-determinadas. Como podemos retormar o poder sobre os nossos bits?

VIDA DIGITAL

André Maia

7/27/20252 min ler

human anatomy model
human anatomy model

É praticamente impossível de não se notar que estamos em uma fase onde a maioria dos dispositivos se conectam e transmitem dados a todo momento (internet das coisas, ou IoT). O autor Jaron Lanier, em seu livro “Você não é um dispositivo", fez uma análise sobre as armadilhas contemporâneas, revelando como as tecnologias digitais não apenas modificam a nossa forma de interagir mas fundamentalmente redesenham a nossa percepção sobre a humanidade.

Para o autor, vivemos em um ecossistema digital que progressivamente nos despersonaliza, transformando os indivíduos complexos em dados manipuláveis e previsíveis. Os algoritmos, longe de serem aparelhos neutros, se tornaram os arquitetos silenciosos de nossa experiência, moldando os comportamentos, os desejos, as identidades e até mesmo as escolhas políticas.

Os usuários das plataformas digitais são simultaneamente os produtores e os produtos. As nossas interações, gostos e movimentos online são convertidos em valor econômico, alimentando um sistema que nos objetifica e vigia continuamente. As redes sociais prometendo conexão, na verdade promovem um isolamento sofisticado onde a autenticidade é substituída por performances digitais.

Lanier propõe uma resistência radical: a recuperação da individualidade através de uma relação consciente e crítica com as ferramentas digitais. É um convite a uma reflexão para ressignificar a existência além da produtividade e do consumo.

O conceito de "rebanho digital" não é apenas uma metáfora mas um diagnóstico de como os sistemas contemporâneos nos condicionam a pensar e a agir de maneiras uniformizadas. Os algoritmos criam as bolhas de confirmação, onde a diversidade de pensamento é substituída por consensos e comportamentos artificialmente construídos, reforçados por influenciadores digitais e empresas.

Cada clique, cada interação deveria ser um ato de afirmação individual e não de submissão a lógicas pré-determinadas.

O modelo econômico das grandes plataformas tecnológicas transformou a intimidade em mercadoria(em inglês, commodity). Os dados pessoais se tornaram um novo petróleo. os usuários cedem a privacidade em troca de serviços aparentemente gratuitos.

A proposta de Lanier não é nostálgica ou tecnofóbica. Ao contrário da primeira impressão, é um chamado à tomada de consciência crítica. Como podemos redesenhar a nossa relação com a tecnologia para que ela nos sirva e não o contrário? Como recuperar a agenda individual em um mundo de conexões algoritmizadas?

Tivemos saltos tecnológicos na recente história da humanidade, adaptando e transformando os diversos aspectos da vida cotidiana mas a humanidade não acompanhou essa velocidade. Agora estamos vendo os efeitos dessa evolução. A vida está mudando significativamente e já vemos os impactos em áreas como comunicação, economia, trabalho(uberização), saúde e privacidade.

O processo de digitalização está alterando a forma como nos conectamos uns aos outros e como interagimos com o mundo. Não se trata de abandonar a tecnologia mas de recuperar o controle sobre ela.

No horizonte da reflexão, emerge um "novo" modelo. Um modelo onde a tecnologia(como foi gestada nos primórdios do Vale do Silício) seja verdadeiramente um instrumento de expansão da consciência, de liberdade, diversidade de pensamento e da realização individual e coletiva.